Loft na Seara.
Recordo com saudade a visita que fiz com Dante Macedo e Conceição Macedo, em que nos acompanhou também o fotografo Fernando Guerra, à moradia Silva Ferreira na Seara do Ribatejo, um projeto da autoria de Dante Macedo/Conceição de Macedo.
Por mais de sete anos, o casal procurou desesperadamente o lugar ideal para construir uma casa de fim-de-semana. Encontrado o ambicionado terreno, dois hectares isolados, com uma antiga ruína e alguma vizinhança distante, convidaram o arquiteto Dante de Macedo para projetar o sonho de ambos. Foi a partir da necessidade de encontrar um sítio para apreciar a paisagem, fotografar, pintar, um lugar de recolhimento, sossegado onde pudessem estar sozinhos que determinaram o local.
Numa conversa sobre espaço, linha, cor, forma, e processo até à concretização desta moradia.
A exigência que Fernando impôs a si mesmo e decidiu a escolha do local, foi que o terreno teria de estar virado ao pôr-do-sol. Para Fernando, são muito importantes as cores do pôr-do-sol, do laranja aos azuis, o espetáculo é digno de ser apreciado.
A amizade entre Dante e Fernando, com mais de trinta anos, ajudou à concretização do sonho. Recorda Fernando que a sua primeira Exposição de pintura foi precisamente no atelier Dante Macedo. Este acompanhou a par e passo toda a sua evolução criativa e assim logo compreendeu que Dante seria o arquiteto que melhor poderia fazer este projeto. Linhas simples, espaço concebido de dentro para fora e uma implantação que não obstruísse a paisagem, mais do que uma necessidade, foi uma ideia pré-concebida.
Segundo Dante de Macedo, houve pela primeira vez uma total cumplicidade de ideias entre si e o seu cliente. Mesmo conhecendo Fernando há tantos anos, foi inédito o caso de existir tamanha sintonia de ideias. Recorda, a primeira vez que ambos visitaram o terreno escolhido, caminhando a Poente, detiveram-se de forma espontânea no local exato onde está hoje implantada a moradia, o atual espaço da sala. A velha ruína que ali existia, mais do que, um pretexto burocrático, permitiu uma continuidade.
Posicionada a Norte e para Sul, a moradia acompanha o ligeiro declive do terreno com espaços divididos por socalcos. No entanto para Dante, a opção de uma volumetria horizontal, é agitada pela introdução de um volume elevado que é um mezanino destinado ao atelier de pintura.
Quando Dante apresentou o primeiro esboço, Fernando, confidenciou que nunca tinha pensado nesta possibilidade mas, compreendeu e partilhou da mesma ideia. Era de facto uma das condicionantes do projeto, um “Loft numa Seara” com um espaço para pintura. No entanto, é possível que Dante tenha sido influenciado por Le Corbusier, inspirando-se na famosa casa do movimento moderno projetada para o pintor Ozenfant. Citando Dante, era fundamental que este espaço separado do loft, com uma dupla dimensão, tivesse vista sobre o interior da casa, mas também pudesse ser visto no sentido oposto. Assim, recorda, ficou tudo definido. Foi um projeto que não teve grandes sobressaltos. A partir daqui foi cumprir as ideias pré-definidas por ambos e, desenvolver na Arquiprojecta um trabalho de equipa coordenado pelo arquiteto Francisco Madeira.
A organização do espaço teve uma concepção simples sem divisões entre espaços e, remete-nos de certa forma, para a arquitetura oriental. Fernando tem especial apreço por estes espaços, a sua formação de pintura e aguarela aproximou-o da cultura oriental e portanto, é claro que houve um subito desejo por um espaço racionalista e depurado, a partir do qual, pudesse pintar a natureza. Refere também os ateliers Nova Iorquinos dos artistas plásticos dos anos sessenta, em velhos edifícios industriais, onde pintavam e viviam sem qualquer divisão interior
Quanto ao seu atelier, voltado a Norte, a luz controlada, sem reflexos permite desempenhar um trabalho de maior concentração estrutural, Dante optou, por uma construção simples, com um ou outro apontamento mais arrojado. Salvo a estrutura do mezanino, executada em estrutura metálica, tudo o resto foi construído de acordo com os processos normais de pilar e viga em betão.
Recorda que, Fernando fez questão que fosse um construtor da zona, habituado a construir casas locais, normalmente com telhadinhos e beiradinhos, a executar a sua própria moradia.
Existe no projeto algum revivalismo na maneira como os autores entenderam e organizaram o espaço. Trata-se claramente de uma referencia a Mies, no entanto, o que marca mais, não é o espaço mas sim, a forma como a moradia apresenta a sua silhueta na paisagem. Quando olhamos para as fotografias ao entardecer, verificamos, como a imagem nos dá esta interação, do volume e da massa na paisagem natural.
A moradia que se desenvolve em dois pisos está implantada num lote de terreno com aproximadamente 18 720.00 m2. No piso térreo encontra-se a entrada da habitação, com acesso direto a uma grande sala de estar, o principal pólo central da casa, aglutinando por um lado a sala de refeições e cozinha, por outro um atelier de trabalho, um quarto, com a sua instalação sanitária privada, uma pequena instalação sanitária de apoio a uma área de leitura, esta com o único acesso interior à garagem.
Quase todos estes espaços têm acesso ao exterior pela fachada poente, onde iremos encontrar um passadiço ao longo da casa, um espelho de água, uma floreira com vista sobre a deslumbrante paisagem.
No piso superior, com acesso por uma escada a partir da sala está a área de atelier de pintura e espaço de lazer, com acesso a um solário/varanda exterior.
Fotografia de Fernando Guerra